Sunday, April 8, 2007

A sociedade de consumo e os limites de crescimento

Este texto foi redigido por mim e a ideia da sua realização foi dada por um amigo meu, quando ele me chamou a atenção para os problemas do consumismo. São algumas ideias que vos apresento, pois acho que é um tema interessante dentro da Economia. Na escola dão-nos noções que nos orientam, mas devemos fundamentar as nossas próprias opiniões.

A partir dos anos 50 o “americam way of life”, que constituiu um modelo para a Europa, vai institucionalizar uma sociedade de consumo/abundância, símbolo da modernidade. Este conceito baseia-se na doutrina do crescimento económico contínuo em que é produzir, sempre cada vez mais, novos produtos, uma vez que o desenvolvimento económico e o nível de consumo não permitem parar (incluindo o consumo de produtos desnecessários).
Na verdade, muitas críticas são apontadas ao crescimento económico e ao consumismo dos países desenvolvidos.
O culto pelo máximo lucro e pelo desejo de possuir, vinculados pela sociedade de consumo, criam desigualdades entre países, ou regiões do mesmo país, entre grupos sociais, entre sectores de actividade…
Os diferentes ritmos de desenvolvimento e de aumento da produtividade nos vários sectores económicos criaram uma remodelação constante da estrutura de emprego. Actualmente, o mercado de trabalho é muito exigente, competitivo e caprichoso exigindo-se ao trabalhador o máximo desempenho e produtividade. Deste modo, os inválidos são postos de lado, os de maior idade que não têm, por isso, qualificação para o trabalho com as máquinas (essenciais para o mundo actual) são despedidos, levando ao aparecimento do desemprego tecnológico e estrutural. Surgem, assim, disparidades: entre os mendicantes, os desempregados, simples trabalhadores; e os grandes donos do capital, que o conseguem à custa da exploração do outro. Infelizmente, utilizam essa riqueza em bens “bem” supérfluos, como alugar um restaurante inteiro e nem ir, as festas onde se desperdiçam enormes quantidades de comida, as roupas e carros absurdamente caros. Desde que o consumo garanta qualidade de vida ao indivíduo, compreendo que exista a necessidade de comprar bens supérfluos. Todavia, o que actualmente se vê é um grande desperdício de dinheiro, quando milhões de pessoas morrem à fome. Tudo isto com um único objectivo: superiorizar-se em relação aos outros; mas que tem um efeito contrário (pelo menos para mim), pois só mostra o quanto é mesquinho e inferior este tipo de pessoas.
O trabalhador tornou-se um autómato, o stress e as depressões são uma constante na sociedade desenvolvida actual. Parece que o mundo laboral é uma “selva”, um “salve-se quem puder”…
A unidade da família é destruída, quer pela falta de tempo dos pais que são “obrigados” a trabalhar ininterruptamente, quer pelas novas exigências dos filhos e os valores de consumo que lhe são impostos. Já não existe diálogo.
Por outro lado, o crescimento desmesurado e a ambição dos países desenvolvidos levam ao esgotamento dos recursos do planeta (de que a progressiva destruição da Amazónia é o melhor exemplo), à poluição e à exploração dos países subdesenvolvidos. Criam-se antagonismos entre as nações: os países desenvolvidos que pautam pela abundância e pelo desmesurado consumo, num lado; e os países subdesenvolvidos cuja população vive na miséria e fome, no lado diametralmente oposto. Contudo, estas desigualdades irão sempre acontecer uma vez que é favorável às intenções capitalistas das grandes potências, ou dentro do país, da minoria rica.
Sente-se, pois, o que é aventado de “crise de valores” desta sociedade de consumo. A meu ver não existe uma crise, visto que os valores existiram, existem e existirão para sempre, mas sim existe uma mudança na hierarquia de valores. E essa mudança será boa?
As crianças e adultos, influenciados pela publicidade, dão demasiada importância à imagem e ao materialismo. Os fenómenos de exclusão social e de bulling acontecem, muitas vezes, por essas razões. Na realidade, as pessoas, actualmente, valem pelo que parecem ser (bonitas, magras…) e pelo que têm (carro de luxo, telemóvel topo de gama, viagens ao estrangeiro, roupas de marca, etc.) e não pelo que são. Este espírito está tão enraizado na sociedade que nem nos apercebemos. A publicidade, considerada uma manipulação e retórica sofística, cria situações paradoxais e novas necessidades: por um lado, incentiva-se o consumo intensivo de comida, através da publicidade “libidinosa” e da criação de grande variedade de produtos apelativos, originando uma população obesa emergente (símbolo da sociedade de consumo); por outro, o ideal de beleza é a magreza, surgindo fenómenos de anorexia nervosa e bulimia e o crescimento do número de cirurgias estéticas (supérfluas).
Pela ganância de dinheiro, não é só o trabalhador que é prejudicado, também o é o consumidor. Muitas vezes, os consumidores são enganados pela empresa e a qualidade dos bens e serviços não é a melhor. Daí que existem diversas entidades promotoras da defesa dos consumidores algumas sedeadas em Portugal de que a DECO é o exemplo mais conhecido, e outras na UE.






No incentivo ao consumo desempenha um papel destacado, hoje em dia, o sistema bancário, através do crédito ao consumo. No passado, o crédito era concedido à actividade produtiva das empresas. Recentemente, este assumiu muita importância ao nível dos consumidores. Primeiramente, dirigiu-se a financiar a compra da casa, depois os bens de consumo duradouros, como o carro e os electrodomésticos e, mais recentemente, as férias e as viagens, chegando-se mesmo a pagar roupas a prestações! O consumismo tem criado o ambiente favorável à política de aliciamento ao crédito, promovido pelas instituições bancárias nos anos 90, e que levou ao endividamento das famílias portuguesas a partir desta década. Actualmente, este é um dos males de Portugal – elevado nível de endividamento, muito acima das capacidades financeiras dos portugueses –, o que demonstram que a nossa população vive muito acima das possibilidades, inebriada por este clima de consumismo. Num outro ângulo, seguindo esta linha de pensamento, surge uma doença ligada ao consumismo: “shopacholic”, ou seja, as pessoas têm desejo de comprar inadvertidamente e sem necessidade, pois é para elas a forma de descarregarem as suas frustrações. Esta doença é um vício como outro qualquer (álcool, tabaco, drogas…) que deve ser assumido e tratado. Com efeito, a sua progressão pode levar ao desemprego, à mendicidade, à exclusão social, passando o doente por uma enorme vergonha, o que pode redundar numa grande depressão, caindo a pessoa num poço sem fundo,
A grande intensidade da vida da sociedade de consumo caracteriza-se pela falta de tempo, não se olhando para os pormenores que dão gosto à vida: um passeio calmo no campo, a prática de desporto (não com o objectivo de se ser magro, mas por gosto de se ser saudável), a beleza de uma mimosa a florir e a inalação do seu delicioso aroma, a leitura de um livro… Para melhor explicar esta ideia pensemos na figura de Miguel Torga, escritor com forte ligação à Natureza, e que através das suas experiências com esta demonstra um elevado humanismo, espírito de bem-estar e paz, propõe um modo de vida calmo, natural. De forma indirecta procede-se a uma crítica do homem através dos elementos da natureza.
A nível da cultura, começa-se a falar numa cultura de massa com o surgimento dos media, que se por um lado permite um maior acesso à cultura, por outro padroniza uma sociedade ou uma cultura “light”. Na verdade, a Cultura transmitida é bastante tendenciosa, pelo que, na actualidade, sobre a égide do lucro, muitas das várias áreas culturais e artísticas (de verdadeira qualidade) não são apoiadas, só se incentivando os filmes comerciais, os programas de qualidade duvidosa e os livros polémicos (os geradores de lucro, não havendo uma preocupação com a qualidade). Além do mais, a “boa” cultura, isto é, a que ajuda para a formação do indivíduo continua a ser só, infelizmente, para uma elite intelectual, visto que os preços não são convidativos ou não há suficiente divulgação. Até nas escolas se sente uma educação de massa, ou seja, espera-se que o aluno saiba os conteúdos programáticos, mas não se incentiva o aluno a aprofundar conhecimentos, a ir mais além, a ser autónomo, a ter iniciativa, a ter gosto pela leitura, não se incute o interesse pelas artes plásticas e audiovisuais e pela filosofia, condições essenciais para a formação de um competente cidadão. Espera-se, portanto, um cidadão sem livre-arbítrio e tecnocrata.
De facto, o desejo pelo lucro levou ao desenvolvimento tecnológico e à grande confiança na máquina. Daí que os ensinamentos da filosofia e ética são dispensáveis pois não fornecem contrapartidas financeiras. Mas esses tecnocratas que me desculpem, mas não há melhor sensação que sentir que posso desenvolver a minha autonomia e pensamento, que vejo o mundo com outros olhos, com mais consciência.. É por essas e por outras que se vê falta de responsabilidade cívica e de cultura nas populações.
Todas estas questões sobre o consumismo que me está inculcado (talvez não tão enraizado como noutras pessoas) assaltaram o meu pensamento, quando um colega meu me alertou para os seus grandes problemas. É verdade que sou influenciada por certas ideias, nomeadamente o conceito de beleza ou de materialismo, mas pelo menos tenho a percepção da sua existência manipuladora e tento na minha consciência dissuadir estas amarras do pensamento autómato, que impedem a verdadeira felicidade.
No entanto, existe uma coisa que odeio: o desperdício. Quando consumo, tenho como pretensão que me irá causar bem-estar ou me vai ajudar a progredir (nomeadamente quando compro dvds, cds, livros, bilhetes de cinema, internet, jornais).
Uma outra inquietação surge no meu pensamento: qual o limite entre o gosto pela moda e o consumismo? Será a moda uma futilidade ou uma arte?
A minha opinião é bastante tendenciosa já que eu olho a moda como uma arte, um meio de transmissão das aspirações, gostos, pensamentos do sujeito. Contudo, não é a moda ditada pelas passerelles, mas sim a moda que cada um faz; nós somos estilistas pessoais. Mas, mais uma vez, a sociedade de massa é estandardizada, surgindo o conceito desvirtuado de moda, perpassando a ideia de falta de vontade própria, de autonomia (compreende agora a importância da filosofia). Eu acho que a pessoa deve escolher esta ou aquela peça não porque é moda, ou porque certa pessoa conhecida a usa, mas sim porque gosta e lhe fica bem.
Num outro âmbito eu gostaria de esclarecer uma ideia: será que gostar de oferecer e receber é um tipo de consumismo? Eu penso que não. Na minha opinião, os presentes demonstram que as pessoas querem agradar-lhe, que conhecem os seus gostos ou que querem que se progrida, ou seja, ao dar-lhe um presente querem ver o presenteado feliz. O grande problema é que esta prática é desvirtuada. Não é só pelos presentes que se sabe quem ou quem não gosta de nós, muito pelo contrário. Não podemos cair no erro de usar como critério que demarca o carácter da pessoa o facto de esta ou aquela pessoa nos dar um presente, medir o amor de um indivíduo, pelo preço ou qualidade da oferta Assim, podemos cair no erro de nos tornarmos consumistas, superficiais e materialistas. Por exemplo: os pais para recompensar os filhos pela sua ausência e falta de tempo, oferecem enormes quantidades de presentes (muitas vezes comprados pela secretária ou que nem se enquadram nos gostos deles); por interesses perniciosos também se oferecem presentes. Estes e outros casos são os motivadores da perda do lindo e importante significado que os momentos de receber/dar presentes (festas de aniversários, os Natais, entre outros exemplos) possuem.
É na consciência destas e de outras consequências nefastas advindas do consumismo que surgem acções de grupos, instituições e pessoas que procuram fazer valer os direitos legítimos do consumidor, melhorar a qualidade de vida e renovar o sistema de valores sociais relativos ao consumo – o consumerismo.
O consumerismo emergiu a partir da consolidação da sociedade de consumo, nos finais dos anos 50, designadamente nos EUA, no Canadá, na Europa do Norte, na Austrália e no Japão. Ganhou projecção internacional em 1985, quando a ONU estabeleceu os princípios orientadores da protecção do consumidor.
Na sequência do consumerismo, nasceu nos anos 80 um novo consumidor, que se caracteriza pela preocupação em cultivar padrões de consumo ecológicos. O consumerismo ecológico traduz-se em comportamentos, manifestações ou iniciativas tendentes a prevenir e a atenuar a gravidade das ameaças ambientais e a promover o desenvolvimento económico sustentável.
Se por um lado, a produção de bens e serviços, crescente, diversificada e a baixo custo unitário, arrastou a que podemos designar por democratização dos consumos, por outro lado, desencadeou uma exploração desenfreada e sem controlo dos recursos naturais e tem vindo a criar desastres ecológicos de dimensão preocupante, por todo o Planeta. A consciencialização, o estudo e a resolução desta problemática está na ordem do dia e tem conduzido muitos países a reunirem-se em cimeiras e fóruns (Fórum de Davos, por exemplo), com o objectivo de definirem, em conjunto, a exploração inteligente e controlada dos recursos naturais, cientes de que a preservação da vida do Homem na Terra depende de todo o equilíbrio ecológico.
É nessa linha que começam a proliferar as indústrias verdes e os produtos ecológicos e se promove a educação ambiental. Recordemos, a propósito, algo que nos é familiar: a directiva dos 3 Rs: Reduzir, Reutilizar e Reciclar.
Espero que reflictam sobre estas questões quando estiverem a consumir. Com efeito, cada um de nós é o culpado destas consequências negativas do consumismo para o ser humano e para o nosso Planeta. Promovam o consumo sustentável e saudável, pois “no meio é que está a virtude”, lá diz o ditado popular!

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